A NÃO INCIDÊNCIA DO ICMS NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE PARA O EXTERIOR
- rodrigoaaaraujo
- Jun 12, 2021
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Updated: Jul 1, 2021
Vislumbramos na labuta diária no tocante as prestações de serviços de transportes que destinam mercadorias ao exterior, o grande equívoco cometido pelo Fisco estadual quando da exigência do ICMS sobre a prestação de serviço realizada, fazendo com que as mercadorias exportadas sejam oneradas pelo imposto, ensejando como efeito negativo a falta de competitividade quanto ao preço no mercado internacional.
No caso vertente, é cediço que as mercadorias destinadas à exportação estão amparadas pela imunidade, que nada mais é que um obstáculo criado por norma constitucional que impede a incidência de lei ordinária de tributação, conforme preconiza a Carta Magna em seu art. 155, § 2.º, XII, "e", in verbis:
Art. 155...................................................
§ 2º - O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
XII - cabe à lei complementar:
e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, a;
Partindo dessa premissa, infere-se que uma mercadoria destinada à exportação não sofrerá qualquer gravame tributário, mesmo que tenha como origem uma operação interestadual antes do embarque para o exterior, visto a própria Lei Complementar no 87, em seu art. 3º, inciso II, parágrafo único, deixar claro que não apenas a operação de exportação, mas também as operações anteriores, que integram o processo de exportação, não constituem fato gerador do imposto, conforme se perquire na transcrição abaixo:
Art. 3º O imposto não incide sobre:
II - operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços;
Parágrafo único. Equipara-se às operações de que trata o inciso II a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a:
I - empresa comercial exportadora, inclusive “tradings” ou outro estabelecimento da mesma empresa;
II - armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro.
Destarte, conforme se depreende da exegese da norma supra, mesmo na hipótese de saídas de mercadorias de uma localidade para outra dentro do território nacional, sem necessariamente ser diretamente enviada para o exterior, tendo a mesma o fim específico de exportação, cuja operação de entrega se destina a uma empresa comercial exportadora, armazém alfandegário ou entreposto aduaneiro, não deverá sofrer o gravame tributário, sendo considerada válida a norma isentiva em virtude da razão da isenção ter como cerne o estímulo às exportações.
Ao falarmos de isenção, urge ressaltarmos que a diferença entre isenção e imunidade decorre da posição hierárquica das normas que as definem. Ainda que a Constituição diga que tal fato é isento do imposto, na verdade não se trata de isenção, mas de imunidade. E mesmo que a lei viesse a definir certa situação como imune ao tributo, ter-se-ia, com certeza, caso de isenção, e não de imunidade, cuja distinção demonstramos abaixo:
- Isenção: é exceção feita pela lei à regra jurídica de tributação.
- Não incidência: é a situação em que a regra jurídica de tributação não incide porque não se configura a sua hipótese de incidência. Pode ser: pura e simples, se resulta da clara inocorrência da hipótese de incidência da regra de tributação; ou juridicamente qualificada, se existe regra jurídica expressa dizendo que não se configura, no caso, a hipótese de incidência tributária.
- Imunidade: é o obstáculo criado por uma norma da Constituição, que impede a incidência de lei ordinária de tributação."
Perfilhando esse entendimento, infere-se que o intuito norteador da norma quando disciplina a não tributação tem por cerne desonerar as mercadorias destinadas à exportação, para assim proporcionar preços mais competitivos no mercado internacional.
Não havendo dúvidas sobre a não tributação relativa as operações cujas mercadorias têm fins de exportação, conforme se abebera da inteligência emergente do art. 3º, inciso II, da Lei Complementar nº 87/96, abaixo transcrito:
II - operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços;
Todavia, vislumbramos que a disceptação ocorre quando da tentativa de aplicar também a imunidade às prestações de serviços de transportes, pois a respeito desse assunto, o Supremo Tribunal Federal entendeu em recente decisão não haver a abrangência da imunidade a prestação de serviço de transporte, conforme transcrição abaixo:
IMUNIDADE DE ICMS EM TRANSPORTES
Serviços de transporte interestadual de produtos industrializados destinados à exportação não se valem da imunidade tributária prevista no art. 155, § 2º, X, a, da Constituição Federal.
In casu, foi esta a decisão do STF ao acolher recurso extraordinário do Estado de Minas Gerais. A empresa de transportes em questão transportava produtos de Minas Gerais até um porto situado em outro Estado, onde seriam embarcados para o exterior.
A decisão do STF reformulou acórdão do TJ/MG que havia concordado com a possibilidade de imunidade de ICMS concernente a prestação de serviço de transporte.
No caso vertente, em sua decisão, ponderou o STF não haver lei complementar excluindo as prestações de serviços nas exportações para o exterior (CF, art. 155, § 2º., XII, e) e que o acórdão recorrido negara vigência ao art. 155, § 2º. IV, da CF (resolução do Senado Federal de iniciativa do Presidente da República ou de um terço dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros, estabelecerá as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação).
Dessa forma, verifica-se que o entendimento emanado do STF tomou por cerne que a imunidade alcança apenas as operações de circulação de mercadorias com fins de exportação, não sendo aplicável aos serviços de transporte interestadual e intermunicipal.
Ao perscrutarmos a jurisprudência a respeito da matéria, vislumbramos que o Superior Tribunal de Justiça se pronunciou na pessoa da EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON, no EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 710.260 - RO (2005/0179881-0), onde a mesma teceu considerações argüindo que:
“...a Corte Maior, data vênia, não adotou a interpretação mais adequada aos fins da exoneração tributária de que se cuida, como adiante será demonstrado. Todavia, ainda que assim não fosse, o julgado em questão já não se presta para orientar o intérprete. Apesar de ser recente aquele julgado, foi o mesmo proferido em Recurso Extraordinário distribuído no Supremo Tribunal ainda em 1995. O fato apreciado é, portanto, anterior à Lei Complementar 87/96.
A tese fazendária em referência, data vênia, é insustentável no plano doutrinário, porque repousa em equívocos, e com o advento da Lei Complementar 87/96 não será mais adotada pela Corte Maior.”
No caso em tela, como muito bem visualizou a nobre relatora, a respeitável decisão da Corte Suprema tomou por lastro normas que disciplinavam as operações relativas a época da eclosão do fato gerador, cuja ação foi ajuizada antes do advento da Lei Complementar n.º 87/96, tendo o processo sido distribuído ao Supremo Tribunal Federal em 1995.
Perfilhando esse entendimento, diante do advento da LC, vislumbramos que a contumácia em tributar a prestação de serviço de transporte que destinem mercadoria para o exterior é deletéria, em virtude de ir de encontro à finalidade precípua da norma constitucional, a qual tem por escopo a desoneração das mercadorias com fins de exportação.
Pois havendo a tributação da prestação de serviços de transporte, estar-se-á tributando indiretamente a operação que destina mercadorias ao exterior, assim como estar-se-á beneficiando aquelas empresas que estão estabelecidas em unidades Federativas que dispõem de Portos, fazendo com que os preços das mercadorias exportadas dessas empresas sejam em valor inferior ao das empresas que são obrigadas a assumir o ônus do pagamento do ICMS sobre a prestação de serviço de transporte efetuada até o Porto.
Ocorrendo neste caso um absoluto desprezo pelo elemento teleológico, já que a finalidade da exoneração tributária pretendida pela norma é tornar o produto brasileiro mais competitivo no mercado internacional.
Neste diapasão, ao haver a tributação em operações anteriores ou mesmo do transporte até o porto, enfraquece-se a norma que pretendeu tornar o produto nacional competitivo no mercado internacional, trazendo prejuízo para o País como um todo.
Perquire-se que com o advento da Lei Complementar n.º 87 estabeleceu-se o adequado alcance do preceito imunizante ou, para quem o preferir, ampliou o alcance daquela imunidade, com fundamento no art. 155, XII, "e", da Constituição Federal, afastando da incidência do ICMS também os serviços, quando a LC no 87/96 disciplinou no art. 3º, inciso II, o seguinte:
Art. 3º O imposto não incide sobre:
II - operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços; (Grifo nosso)
Neste diapasão, observa-se na exegese da norma supra transcrita que não incide o imposto sobre a prestação de serviços que destinam mercadorias para o exterior, assim, ao lembrarmos que o ICMS incide apenas sobre prestação de serviços de transporte intermunicipal e interestadual, sendo descabida a tributação acerca da prestação internacional, chega-se a ilação de que a destinação de serviço para o exterior tem por cerne o transporte daquelas mercadorias relativa a prestação intermunicipal ou interestadual que têm como objetivo a exportação das mercadorias.
Destarte, quando a norma supra se refere à prestação que destinem serviço ao exterior, reporta-se ao transporte efetuado dentro do território nacional para transportar as mercadorias da origem até o destino com fins de exportação, cuja desoneração da operação deve ser in totum, conforme a finalidade de tornar os preços dos produtos nacionais mais competitivos no exterior.
Assim, uma mercadoria que sai do Estado da Paraíba para ser exportada pelo porto de Suape em Pernambuco, não deverá sofrer o gravame da incidência do ICMS sobre a prestação de serviço de transporte da mesma, diante da finalidade de desoneração das mercadorias com fins de exportação.
De posse destas considerações, ao perscrutarmos o entendimento de outras unidades da Federação, vislumbramos que só existe a tributação equivocada da prestação de serviço de transporte que destinam mercadorias para o exterior em algumas unidades da Federação, a exemplo da Paraíba, já que a própria jurisprudência dos tribunais administrativos de outros Estados acolhe a tese da não tributação, em decorrência da interpretação teleológica e sistemática do dispositivo contido no art. 3º, inciso II, da Lei Complementar nº 87/96, conforme se abebera do seguinte julgado do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo, vejamos:
Transporte Internacional – Subcontratação – O transbordo não constitui nova prestação de serviço – Negado provimento ao Pedido de Revisão da Fazenda 4. Momento da Ocorrência do Fato Gerador.
É indevida a cobrança de ICMS sobre o serviço de transporte de bens destinados à exportação. Assim, nem se deveria cogitar de saber qual seria o Estado competente para exigir o ICMS. O Imposto, definitivamente, não é devido. (Grifo nosso)
Dessa forma, verificamos que a tese suscitada em nosso Estado para a exigência do ICMS sobre a prestação de serviço de transporte que destina mercadoria para o exterior tem como cerne a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal quando assim decidiu:
IMUNIDADE DE ICMS EM TRANSPORTES Serviços de transporte interestadual de produtos industrializados destinados à exportação não se valem da imunidade tributária prevista no art. 155, parágrafo 2., X, a, da Constituição Federal.
Ora, temos que concordar que realmente não há a previsão constitucional concernente à aplicação da imunidade a prestação de serviço de transporte, todavia, através da Lei Complementar no 87/96, em seu art. 3º, inciso II, disciplinou-se que não incidiria ICMS sobre a prestação de serviço de transporte, entendimento este albergado pelo RICMS/PB quando no art. 4o, inciso II assim dispõe:
Art. 4º O imposto não incide sobre:
II - operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados e semi-elaborados, ou serviços; (Grifo nosso)
Portanto, observa-se existir no próprio RICMS/PB a previsão legal para não se efetuar a tributação da prestação de serviço de transporte quando as mercadorias se destinam a exportação, não se trata de imunidade tributária, conforme decisão proferida pelo STF, e sim de uma norma isentiva que se encontra no RICMS/PB como não-incidência, onde a mantença da exigência vai de encontro ao objetivo principal do legislador constitucional, que é a desoneração tributária das mercadorias com fins de exportação.
Entendimento este ratificado pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em sessão realizada por videoconferência em 28 de abril de 2021, onde formalizou a Súmula de nº 649, pela qual foi consolidado tema muitas vezes já apreciado pela Corte, sob o enunciado: “Não incide ICMS sobre o serviço de transporte interestadual de mercadorias destinadas ao exterior”.
No caso vertente, a súmula tem como base o entendimento da 1ª Seção no EREsp 710.260/RO, que reconheceu, conforme o art. 3º, inciso II, da Lei Complementar nº 87/96, que a isenção de ICMS sobre operações e prestações de mercadorias destinadas ao exterior se estende inclusive ao transporte interestadual referente as mercadorias destinadas ao exterior.
Nesse diapasão, quando da ocorrência da sessão por videoconferência, os Ministros ressaltaram que a nova súmula busca esclarecer a compatibilidade do entendimento da 1ª Seção sobre o tema, com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 754.917 (Tema 475 de Repercussão Geral).
Ressaltando que súmula recém editada trata sobre isenção tributária, enquanto a tese firmada pelo STF analisou a imunidade tributária constitucional prevista no art. 155, § 2º, inciso X, alínea “a”, da Constituição Federal.
Todavia, apesar do STF ter decidido em face ao Tema 475 que “a imunidade a que se refere o art. 155, § 2º, X, ‘a’, da CF não alcança operações ou prestações anteriores à operação de exportação”, o reconhecimento, pelo STJ, da configuração da isenção com fundamento na LC nº 87/96, em tese, resguarda o contribuinte quanto a cobrança do ICMS nas prestações de serviços de transporte interestadual de mercadorias que se destinam mercadorias ao exterior.
Ao tempo em que é de bom alvitre ressaltarmos, que esse entendimento tem amparo na Súmula nº 649 do STJ, publicada em 03 de maio de 2021.
Autor: Rodrigo Antônio Alves Araújo

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